Por que escrevo?
Escrevo para não morrer.

(José Saramago)

quarta-feira, 27 de maio de 2009

ERÓTICA SAGRADA

Rasguei a colcha dos retalhos
de minhas dores depositadas em cada verso torto.
Violentei as algemas da palavra amor
A palavra amor fere a imortalidade do tempo.
Por vezes, ela sangra as veias secas em cada minuto de súplica.


Aceitei a batalha de troianos e gregos
Qual Eros e Vênus com lenços de lixo vermelho.
Sangrei o negro corpo epifânico das Musas palavras.
Tirei meus pés caligráficos do charco de lixo
para senti-la poderosa e nua de mim.

Transvesti-me da ganância erótica da poesia
E encontrei-me no paganismo e cristianismo
Porque despi o divino e sacralizei a poesia.

ROSIDELMA FRAGA.

terça-feira, 12 de maio de 2009

POR QUE ESCREVO OU POR QUE ESCREVER?
















Escrevo porque sou como um prometeu acorrentado pelas letras. Ora, não há como soltar as algemas das mãos que buscam a profecia poética e o discurso prosaico. Escrever é aprisionar-se e querer estar preso por vontade. É servir a quem busca saciar a sede de palavras.Escrevo para certificar a cor do orgasmo que todos os dias procura sair da memória em busca do encontro erótico com o papel. Escrevo para "gozar no papel" e a lesma "gosmar na gente", como faz Manoel de Barros. Escrevo por genuíno erotismo porque a linguagem é corpo.Escrevo porque uma força epifânica e intensa me leva ao paraíso e ao mesmo tempo ao inferno de Dante. Escrevo porque tenho a paciência de Virgílio e a esperança de Penélope na busca da completude lírica. Escrevo porque navergar é preciso. Escrevo porque não sou nada e tenho em mim todos os sonhos do mundo. Sonhando eu posso lutar com as palavras que me acariciam em doce regozijo. Escrevo porque sei que terá sempre um leitor com sede de metalinguagem. Sempre haverá alguém que virá às minhas páginas em busca de pão e fonema. Escrevo para fazer as palavras ocas boiarem no alguidar e depois selecionar o ínfimo para sentir-me grande no ato da crítica que é metalinguagem, ao estilo de João Cabral de Melo Neto.Escrevo para provar ao mundo e a mim mesma que nasci com o dom das palavras e são elas que iluminam a minha vida no universo livresco. São de palavras que vivo. Ou vivo exatamente porque tenho que escrever. Escrevo para sobreviver. Escrevo porque sou nômade e encontro na minha assoberbada vida de professora, um minuto de orgasmo e contemplação do ócio Não há nada melhor para as minhas mãos envelhecidas, saber que arranho os céus, por excelência, quando escrevo. E ainda me perguntam por que escrevo? Será que há respostas? Sei apenas que escrever, como diria José Saramago, é garantir que se está vivo. "Escrevo para não morrer", disse ele. Como morrer sem deixar algo escrito? A minha imortalidade está aqui nesta página branca e não na Academia Brasileira de Letras. Sou imortal. Não morrerei porque nasci para encantar, como disse Guimarães Rosa, "as pessoas nunca morrem, ficam encantadas". É por causa desse encantamento, da seduçao, do ego e da vaidade que escrevo sempre para tornar-me o Ser no tempo existencial.Escrevo um poema em poucos minutos e depois trabalho verso por verso, viro o mundo do avesso e fico com o gozo da poiésis. Às vezes me dão temas para escrever e aceitar a um desafio entre mais de trinta mil que escrevem em diversos gêneros textuais. Sinto o gosto do vinho afrodisíaco das palavras que não saem quando quero falar, mas borbulham sem parar quando escrevo. Logo, rasgo a "folha branca e asséptica" e começo a rebentar palavras. Escrevo três crônicas e elas vão para as coletâneas das 100 melhores redações de professores premiados pela ABL e eu fico com o orgasmo na ponta do meu lápis, pensando em escrever mais uma história "para provar que sou sublime". E ainda me desafiam com a pergunta "por que escrevo?". "Ora essa": escrevo porque sempre terá um leitor que sentirá comigo o orgasmo absoluto da palavra a procura da poesia que "tem mil faces secretas sob a face neutra", conforme bebi agora mesmo em Carlos Drummond de Andrade para provar que não nasci em Itabira, não obstante, nasci gauche para falar e vim ao mundo para escrever esta e outras histórias. Em suma, escrevo porque escrever é descobrir o interminável sempre.
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domingo, 3 de maio de 2009

Roteiro das mãos

Que tenho afinal além das mãos?
mãos frias e castigadas de tempo.
mãos sonolentas, sensuais e espirituais.
Tempo e templo em tempos de poesia
são a poesia que inunda-me os dedos celestes,
dedos longos, amalgamados nas mãos.


As mãos sacodem os galhos verdes mui atrevidos...
Audaciosos os galhos percorrem meu corpo.
Minhas mãos são matéria sedenta por palavras


Tenho apenas as mãos que seguem um manual:
São mãos para as teclas negras do piano,
Mãos para tocar a palavra do avesso,
Mãos para afagar e acariciar o dorso do tigre,
Mãos selvagens no afã de cada poesia que espera ser escrita,
Mãos que não participam da guerra,
apenas tocam a nudez de cada sílaba e cada nota.


Eis, leitor, as minhas mãos.
Vinde, vede e observe-as: são duas mãos.
Simplesmente duas mãos que zombam,
rasgam, apertam, escrevem e falam em todo tempo.
Para que tanto valor às mãos?
Para que tanta palavra para dizê-las?
Sim. Preciso de palavra poética para falar das mãos
Palavras de poeta nunca dizem o valor das mãos
Passo a vida inteira e vem a água e apaga a metáfora das mãos
Escrevi sobre seu valor na areia da praia.
Penso que ninguém fala delas no mundo epifânico da poesia.
Porém, meu leitor, eu louvo-as sempiternamente no poema
porque as palavras partiram e as minhas mãos ficaram.

Rosidelma Fraga.